A R.Nott Magazine interrogou, enfim, uma das figuras que influenciaram o seu nascimento ainda em 2013: o argentino, fotógrafo e diretor, também ator e também poeta, também provocador e instigador, Carlos Gindzberg. Esse é, desde já, um dos Interrogatórios mais marcantes já realizados aqui. Confira tudo abaixo!
“O cinema, a realização de filmes, é produto da vontade e do esforço de muita gente, pelo menos de um grupo de pessoas. Os longas-metragens que eu pude realizar são consequência da imaginação e do desejo compartilhado de amigos, pessoas próximas, em geral algo imunes ao desalento causado pelo trabalho sem destino nem seguro de sua realização, aventureiros, gente que tem agrado tanto pela rota quanto pelo porto de chegada.“
– Querido Mestre Carlos, obrigado por essa entrevista, já que é uma grande influência para o nascimento da R.Nott Magazine desde o ano em que tudo começou, lá em 2013.
Obrigado, Vinicius, pelo convite e pelo interesse. E é uma grande surpresa e alegria saber que sou parte (de alguma forma) da origem desta publicação, mesmo que isso certamente seja um excesso de generosidade de sua parte. De qualquer modo, sigo acompanhando o assunto e aprovo a experiência, com meus melhores desejos.
– Como, onde, quando e por quê.
Como toda origem, a minha no cinema tem essa cor quente e autocomplacente da infância. Eu cresci num bairro trabalhador do subúrbio de Buenos Aires, fruto do loteamento apressado de terrenos e da necessidade estabelecida pela migração interna em direção às grandes cidades a partir da primeira metade do século XX, mas que se intensificou durante os dois governos de Perón. Meus avós espanhóis – os outros eram polacos – construíram sua casa num quadrado de terra, sem eletricidade, sem água encanada, e sem rede de gás domiciliar, numa paisagem que quase não mudou depois de meio século. Tínhamos ali um televisor que funcionava graças a um elevador de tensão: a eletricidade vinha, no começo, de apenas um vizinho (com a contribuição da Sociedad de Fomento dali), que a distribuía pelas poucas casas que se tinham levantado. Aos sábados era transmitido por um canal (dos cinco que havia) um programa que ocupava toda a tarde, e se chamava “Los Sábados de Super Acción”: passavam quatro filmes, quase todos de produção estadunidense, quase sempre Westerns. Eu me sentava junto ao meu pai do meio-dia até a noite, como duas rãs diante do “sol de noche” (uma lamparina a gás); ele para retornar às séries de Tom Mix às quais era ligado quando garoto no bairro tangueiro de Boedo, e eu para estar perto dele, dos seus sonhos impossíveis que iam se tornando meus, que eu reproduzia nas brincadeiras de índios, vaqueiros, arcos e pistolas de chumbinho, enquanto corríamos por matagais ou por cima das árvores até o céu alegre de uma comunidade que militava pela mudança vindoura. Quando completei dez anos, partimos dali. Meus pais voltaram à cidade, a Buenos Aires, e eu perdi o horizonte aberto e os amigos, mas obtive a possibilidade e a proximidade de uma boa formação pública, da cultura livresca e da música que nesses tempos estava nascendo em todo o continente, o rock local, em nosso próprio idioma. O segundo grau, os primeiros amores e a fé adolescente ocorreram durante a ditadura mais feroz que a Argentina conheceu, a mesma do começo do curso em Engenharia Eletrônica. Mas tudo isso entrou em crise em 83, com o retorno à democracia: os amores, as atividades, o trabalho, o estudo e, sobretudo, o futuro. Enquanto tentava continuar com a engenharia, comecei a fazer teatro, e logo após um tempo insuportável, tudo se desmontou, e ficou apenas a promessa redentora do cenário num momento político pequeno e curto onde essa promessa, a redenção, era o tom, a cor e a forma que pareciam que iam tomar o espírito do tempo. Obviamente que não foi assim. De qualquer modo eu permaneci ali, no Teatro Independente, sem abandonar a luminescência das telas e dos projetores, por cerca de dez anos, até os meus trinta, até os anos noventa de todos, até essa recaída da qual seguimos ainda deslizando até o fundo. Quis estudar cinema, mas a única possibilidade que havia nessa época para mim, sobretudo pelos tempos dos quais dispunha, era uma escola privada, sumamente cara (Universidad de Cine, fundada por Manuel Antin). Comecei a estudar Psicologia e organizei minha vida com uma mulher que não tardaria em desencadear uma patologia autoimune bastante limitadora. Terminei o curso, praticamente a única coisa que pude fazer nesse período. Fomos para a Espanha, porque era o único país que poderia proporcionar o tratamento que ela precisava, e nosso Estado, durante os anos noventa, carecia de tudo. Além disso, pude estudar Arte. Mais de uma década me formando, vendo filmes, lendo quilômetros de folhas impressas, até a hora que meu corpo pediu por movimento, bem como minha avó galega costumava sentenciar: “el cuerpo te pide y hay que darle gusto” (o corpo te pede e se deve atendê-lo). Em 2001 eu virei uma truta, nadando contra a corrente imparável de argentinos que saíam apressados do país. Voltei no 10 de setembro, um dia antes do ataque às torres gêmeas, e a três meses da derrocada quase terminal da Argentina, um momento mais, um ciclo de retorno à fuga e ao assassinato. Voltei com Pessoa na bagagem, Pessoa o português, meu Pessoa, o da melancolia e da fragmentação, o Pessoa do meu país, o dos quatro primeiros versos de Tabacaria: Não sou nada / Nunca serei nada / Não posso querer ser nada / À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo. A partir dali o cinema, sua luz e seu sonho, foram meus também, e teria que esperar mais uma década para cumpri-lo.
– Como é fazer cinema na Argentina hoje?
O cinema, a realização de filmes, é produto da vontade e do esforço de muita gente, pelo menos de um grupo de pessoas. Os longas-metragens que eu pude realizar são consequência da imaginação e do desejo compartilhado de amigos, pessoas próximas, em geral algo imunes ao desalento causado pelo trabalho sem destino nem seguro de sua realização, aventureiros, gente que tem agrado tanto pela rota quanto pelo porto de chegada. Sem isso não há (nesta parte do continente) cinema de baixa produção ou independente. Mas nem todos podem se manter indefinidamente nesse lugar, principalmente nessa época marcada pelo desemprego, pela decepção e pela apatia. Mas além disso, é necessária a obtenção de grandes fundos (mesmo para o cinema de baixos recursos) sem os quais é inevitável naufragar tantas vezes quantas se pode levantar com a vontade disposta a voltar a tentar. Contamos na Argentina com um Instituto de Cinema (INCAA) que é fundamental para sustentar a produção de filmes, mas que nem sempre é a mesma coisa. Oferece possibilidades determinadas pelos governos da vez, suas prioridades e interesses. O INCAA depende diretamente do Poder Executivo, embora seu estatuto estabeleça que seu funcionamento é autárquico. Em 2008 se inaugurou um período distinto na Instituição e na produção de cinema. Mudou seu procedimento de seleção de projetos e se estabeleceram novos fundos destinados sobretudo (mas não unicamente) ao cinema documental de baixo orçamento: fazer mais filmes com menos dinheiro por meio de produtoras pequenas ou até mesmo por produtores individuais, sem a solicitação de grandes avais profissionais, que nesse momento estava apenas nas mãos de poucas empresas consagradas e sustentadas por uma longa relação com o Estado. Isso foi produto da luta de agrupações e agremiações ligadas ao cinema, mas também dos que estavam encarregados do Estado nesse momento, do seu programa de inclusão da produção audiovisual numa estrutura mais ampla de promoção cultural e de tratamento de temas e formas que atravessavam com enorme dificuldade a seleção do INCAA, numa etapa de certas mudanças de expectativa política, de direção que podemos chamar progressista que acontecia no hemisfério sul do nosso continente. Estabeleceu-se, por exemplo, a constituição (ad hoc) de Comitês de Seleção, onde seus membros, que em geral fazem parte das diferentes agremiações relacionadas às distintas áreas da produção, são escolhidos especialmente para cada concurso, e logo é dissolvido. Cada via de apoio sustentada pelo INCAA, correspondente aos diferentes níveis de produção, tem seus próprios Comitês, o que torna difícil a união de critérios, reduzir e direcionar a seleção dos projetos apresentados, estabelecer limites morais, éticos ou políticos. Dessa maneira foi possível que eu, ou grupos de pessoas como eu, tivéssemos acesso à produção audiovisual. A mudança foi enorme e os resultados muito bons, inclusive avaliados por algo tão superficial, mas necessário para o controle estatal, como os prêmios e o acesso a Festivais de Cinema. Aí vem outro grande tema, a distribuição, a exibição em salas, que é muito difícil de sustentar e resolver. É um grande problema, porque se trata da conversão de um grupo de ideias e imagens levadas a concretizar-se num objeto negociável no Mercado, com os condicionamentos e restrições deste, onde existem determinações muito difíceis de admitir. Essa dificuldade promoveu a promulgação de normas, mas que foram em geral inócuas frente às multi-salas, muitas vezes ligadas diretamente às distribuidoras internacionais, cujos objetivos muitas vezes estão além até mesmo dos interesses dos grandes produtores locais e seus filmes (possivelmente) blockbusters. Para reduzir essa situação, o próprio INCAA gerou um sistema de exibição próprio em todos os distritos do país, abrindo salas para garantir a distribuição do cinema que ajuda a produzir. A existência de todo esse sistema estruturou um dispositivo de produção muito importante, e se fizeram muitos filmes com ritmo constante. O cinema argentino vem mantendo um lugar de certa relevância na produção internacional, o que nos possibilitou expressar nossos problemas e nossas histórias e se gerou toda uma nova camada de pequenas produtoras e seus temas e formas que dificilmente poderiam existir fora deste cenário. Nesse ponto o Estado, sua presença, seu programa de fomento e de delegação externa e independente de seleção de projetos, é fundamental. Como em todas as políticas públicas, há limites e alguns desvios, mas, ainda assim, continua sendo um caminho promissor que é necessário manter e aprofundar.
– O que é A Arca de Medusa e como isso começou?
A Arca começou em 2001, no meu retorno da Espanha. Comecei a dar aulas de fotografia em diversos Centros Culturais da Cidade de Buenos Aires, primeiro no Centro Cultural San Martín, depois no CC Recoleta e, finalmente, no CC 25 de Mayo, todos sob a administração municipal. As possibilidades de exibição das imagens dos alunos nessas Instituições eram escassas, uma semana ao ano em alguns poucos metros de parede. Era uma época sem redes sociais e sem fotografia digital. Decidi, então, desenhar uma página web para albergar e publicar de forma permanente a enorme quantidade de fotos que se foram acumulando à medida que as aulas avançavam. Assim, cada aluno podia “linkar” aos seus contatos o seu próprio trabalho, e também dos seus companheiros. Eu me propus, desde o começo, articular imagem e poesia, e também nas aulas, sobretudo nas de “Construir uma Obra”, um dos seminários que dava com um perfil clínico autoral, onde as séries se conectavam com textos poéticos que também eram publicados no mesmo site, El Arca de Medusa. Nesse mesmo espaço eu pude também ir alojando o meu projeto, que tinha trazido da Espanha, de rodar um filme baseado na Obra de Fernando Pessoa. Muitos dos que participaram nesses cursos me acompanharam nesse caminho, e com alguns deles conseguimos realizar o filme e estreá-lo no fim de 2015.
– Sobre o filme Paraíso – Una historia de Heterónimos: qual é a sua relação com a obra de Fernando Pessoa? Fale um pouco de como se gerou essa ideia e da produção da obra como um todo. Ademais, foi de alguma maneira possível fazer com que o filme fosse transmitido para países falantes do português?
Eu conheci Pessoa, e alguns dos seus textos, durante os anos 80. Sob a direção de Alejo Piovano eu participei de um espetáculo poético que se chamava “Estrellas, Pan, Bibliotecas”. Um dos textos incluídos nisso era o Tabacaria, um poema escrito pouco antes da morte de Don Fernando em 1935, sob o heterônimo de Álvaro de Campos. O texto permaneceu ali, e só voltei a ele ou a outros do escritor luso, por prazer, em 2001. Nesse momento, excedido, sem muito que esperar nem caminho pra percorrer, esperando a saída do tratamento de reabilitação da pessoa que era a minha companheira na época, num bar de tapas da Cidade de Granada, Pessoa se incrustou em meu punho e empurrou a minha sensibilidade pela década seguinte. Andei por um largo tempo alternando entre a identificação e a repulsa à Obra e seu gesto. Fiquei obcecado, li tudo o que pude, ensaios, a própria Obra, o “Drama em gente”, essa operação teatral de desdobrar-se em inúmeros personagens, essa confraria de heterônimos, os poetas que são Fernando, enquanto nenhum deles seja ele. A ideia de que do outro lado das palavras não há uma vida, e sim um personagem, e que tudo se esvazia, se converte em literatura, me pareceu que poderia virar a imagem dessa época, da minha, sobretudo, e, depois de um tempo, da minha comunidade. Um mundo sem fundo nem transcendência, onde apenas pululam personagens, um mundo de lúcidos apreendidos pela melancolia, obrigados a repetir palavras e ideias impróprias, mas que ao mesmo tempo são sua mais íntima consistência. Um mundo sem história, ou como se vem apresentando ao final dela: um monte de marionetes abandonadas no palco, mas profundamente sozinhas, cada uma com seus fios desgastados. Minha intenção, desde o começo, foi problematizar isso, minha identificação com a Obra. Restituir no relato algo da ordem do vital, histórico, habilitar a possibilidade de pensar em justiça, em ética, limitar a voracidade da melancolia que busca engolir a tudo. O filme é uma história de heterônimos, de personagens, de um autor que também se reduz à sua própria letra, abandona a vida para se perder no sonho, tal como Pessoa recomendava aos jovens que escutavam-no ou liam-no num país que tinha perdido o brilho e a glória dos séculos XV e XVI. Era uma sombra disso na primeira metade do século passado. O mundo era dos outros europeus, e ficavam sós os versos de Camões e o fado que faziam tremer os anseios da rítmica percussiva da ditadura de Salazar. E isso colocava-o muito próximo da Argentina, de seus pressupostos constantemente negados, de seu mito de origem nunca cumprido, de sua estirpe tangueira e nostálgica aos saltos entre golpe militar e golpe militar desde os anos 30. Uma comunidade que faltou ao compromisso, que se perdeu, igual ao D. Sebastião, o mítico rei português desaparecido em batalha, mas vivo nos corações dos que ainda o esperam. Pessoa o traz em Mensagem: Que importa o areal e a morte e a desventura se com Deus me guardei? É o que sonhei que eterno dura, é Esse que regressarei.
P.S.: o filme participou do Festival de Avanca em Portugal, mas sempre foi difícil (até agora impossível) que uma distribuidora local se interesse em sua distribuição nesse país. Tampouco no Brasil.
– De onde veio a ideia para o documentário Hacerlo Todo? Por que foi importante aproximar-se do tema da Psiquiatria Social através do contexto do serviço Lanús em Villa Jardín?
Através da minha formação em Psicologia, eu havia conhecido a experiência do “El Lanús”, o primeiro Serviço de Saúde Mental num hospital geral na Argentina. Um espaço considerado um ponto de inflexão na prática dessa área em boa parte do continente. Seu fundador, o Dr. Mauricio Goldenberg, foi também parte da origem do curso de Psicologia na Universidade de Buenos Aires e do Instituto Nacional de Saúde Mental. Inicia uma reforma que será contemporânea à de Basaglia na Itália, mas que tem características locais, principalmente por acontecer numa época cuja intensidade política acaba por converter todo o projeto numa verdadeira tragédia. A etapa gloriosa do Serviço vai desde 1956 até 1976, quando o Processo Militar no poder impõe o exílio à maior parte dos seus profissionais, depois de ter sequestrado três deles, dos quais sobreviveram apenas dois. Tratou-se de uma experiência muito diversa e de muitos matizes, que tentou incluir em suas intervenções uma ideia intercausal do mal-estar subjetivo, sobretudo a inclinação a incorporar a dimensão social do sofrimento, os direitos humanos e a autopercepção ética do seu trabalho. Saúde Mental também era (e é) não viver amontoados, ter esgotos, ter vacinas, educação, espaço, e compreender que toda melhora vem também com a participação. Isso, no cenário de uma vida política que se ia desenvolvendo cada vez mais autoritariamente, não podia terminar bem. E assim foi. “Hacerlo Todo” deveria ser um dos três filmes que tenho ambição de realizar para contar a história de “El Lanús”. O filme que eu já pude exibir com notável repercussão conta a experiência da vanguarda do Serviço, sua saída dos muros do hospital para intervir nas favelas pobres levantadas nas margens do Riachuelo, um espaço de contaminação endêmica. Para mim, essa história desenha uma espécie de fronteira entre as outras duas, as de etapa fundacional e a da decadência (desde o Processo Militar até os nossos dias). Os três filmes pretendem sugerir a dificuldade de pensar os problemas subjetivos fora da História, da política, das ideias morais, do que acreditamos e nos propomos a ser. Desde o início, me pareceu que a história do Serviço era uma alegoria nacional, um conto que ilustrava um curso de decadência iluminado por grandes propósitos truncados pela violência ou pela preguiça. Um ciclo de repetições intermináveis, de programas pilotos, de retorno ao nada. Um país com sua pedrinha sobre o ombro, carregando-a até a beira, para onde voltará a atirá-la. Uma paródia de Sísifo, um modo de existir infinitamente igual.
– Os filmes completos estão disponíveis gratuitamente em seu canal no Vimeo. O que você pensa a respeito do acesso gratuito à Cultura?
O filme que está disponível no VIMEO é “Paraíso”. “Hacerlo Todo” ainda tem o acesso limitado por uma senha, esperando a estreia (postergada pela Pandemia) em algumas das salas oficiais (que pertencem ao INCAA). Minha intenção é a de liberá-la logo, embora já tenha sido projetada durante o ano passado em mais de quarenta Instituições ligadas à Saúde Pública. Minha preocupação é realizar filmes, poder conseguir fundos para fazê-los. Qualquer forma de circulação e de exibição será bem-vinda. Gostaria de chegar até o último espaço onde fosse possível apresentá-los, sem restrições.
– Fale um pouco da importância de instituições como o Centro Cultural San Martín, e de qual é o status da cultura do país nesse momento.
Na Argentina existem vários Institutos de fomento. Já contei sobre o INCAA, no caso do cinema, mas também existe, por exemplo, a assistência à atividade teatral, apoios e subsídios específicos que asseguram a possibilidade de arrendar uma sala e apresentar uma peça sem um risco excessivo. Isso faz com que haja em Buenos Aires uma oferta teatral imensa, difícil de ver em outras cidades do mundo. Os Centros Culturais e os teatros da Cidade tentam abordar produções que os grupos independentes não poderiam bancar. Mas também viram sua atividade corroída pelos imperativos econômicos dos últimos anos, pelas restrições orçamentárias e certa deriva à privatização dos seus serviços. Esse país não vive fora do mundo, tal como ele é. E é assim já faz bastante tempo.
– Que artistas argentinos contemporâneos – de fotografia, cinema, artes visuais, ou o que for – você recomendaria?
Na Argentina existe uma enorme diversidade de caminhos e propostas estéticas muito valiosas. No cinema já faz muito tempo que me entusiasma a Obra de Lucrecia Martel, uma realizadora muito pessoal, inquietante, profunda e revulsiva. Como em todas as épocas, o espírito do tempo se apodera dos corações e alinha-os de alguma maneira, homogeniza-os. Temos, por sorte, alguns que podem apresentar, de todo modo, as suas melhores dissonâncias. Lucrecia é um deles. Podem-no buscar, por exemplo, em “La Ciénaga” (2001), “La Niña Santa” (2004), “La Mujer Sin Cabeza” (2008), ou no mais recente “Zama” (2017).
– Quais são as suas maiores influências?
As influências, as minhas, pelo menos, vão mudando com meus interesses, com os problemas que quero confrontar. Tenho, sim, certas aberturas, mudanças no leme da minha vida que foram decisivas, que funcionaram como pontos de apoio para o braço da alavanca que eu queria colocar, torcer, e seguir por outro caminho. Um deles foi Mario Caponi, meu professor de teatro. Depois tive vários outros, mas com ele pude iniciar uma deriva de experimentação emocional que abriu uma forma nova de abordar tudo o que viria depois. Conheci cedo o existencialismo, o teatro russo e algo da poesia contemporânea. Dali fui ao cinema de Tarkovsky e do polaco Wajda, iluminado por seu lirismo e sua concepção ascética do que se apresentava nos planos. A outra vertente vem do meu pai, dos seus sonhos, do seu cinema, de Capra, Ford e Wilder. Ao cinema argentino eu cheguei mais tarde, talvez por culpa de tanta censura, minha adolescência foi tragada pelo disciplinamento social dos militares no poder. A partir de 83 eu pude recorrer mais tranquilo pelos filmes de Gleyzer, Favio ou Renán. De todos modos, há uma constante na qual persisto: é lendo que eu imagino o cinema. Leio muito, é uma espécie de busca constante, espero ver nas letras dos ensaios ou dos poemas aos céus, os unicórnios, e as experiências fabulosas que logo povoarão os meus planos. Não leio para entender. Leio para imaginar.
– Quais são teus projetos futuros?
Como mencionei mais acima, quero terminar os dois filmes restantes para contar a história do Serviço fundado por Goldenberg. É uma epopeia de mais de sessenta anos de história argentina. Passando a Pandemia veremos que Instituto de Cinema teremos, e de que forma ele poderá acompanhar nossos projetos. Também quero voltar à ficção, que é o registro que sinto me oferecer um maior grau de liberdade. Tenho uma história em que estou trabalhando, poderia se chamar “La memoria”, uma tentativa de problematizar a sua existência junto à justiça.
– Que pregunta você gostaria de responder e nunca te fizeram?
Mais que respondê-las, eu gostaria de formulá-las, tentar promover a dialética, negativizar ideias e formas, gerar movimento. Creio que o cinema, seu poder poetizante e sua possibilidade de chegada massiva podem contribuir muito para a história a se fazer.
Versión en Español
– Querido Maestro Carlos, gracias por esta entrevista, puesto que eres una gran influencia para el nacimiento de la R.Nott Magazine desde el año en que todo esto empezó, allá en el 2013.
Gracias Vinicius por la invitación y el interés. Y una gran sorpresa y alegría saberme parte (de alguna forma) del origen de ésta publicación, aunque seguro es un exceso de generosidad de tu parte. De todos modos me hago cómplice del asunto, y abono la experiencia con mis mejores deseos.
– Cómo, dónde, cuándo y porqué.
Como todo origen el mío en el cine tiene ese color cálido y autocomplaciente de la infancia. Crecí en un barrio obrero del conurbano bonaerense fruto del loteo apresurado de terrenos y de la necesidad que estableció la migración interna hacia las grandes ciudades a partir de la primer mitad del siglo XX, pero que tomó más fuerza y velocidad durante los dos gobiernos de Perón. Mis abuelos españoles, los otros eran polacos, construyeron su casa en una cuadrícula de tierra, sin electricidad, sin agua corriente y sin red de gas domiciliaria, un paisaje que no varió en exceso después de más de medio siglo. Allí teníamos un televisor que funcionaba gracias a un elevador de tensión: la electricidad provenía al comienzo de un solo vecino (con el aporte de la Sociedad de Fomento local) que la distribuía en las pocas casas que se habían levantado. Los sábados transmitían por un canal (de los cinco que había) un programa que ocupaba toda la tarde, se llamaba “Los Sábados de Super Acción”: se proyectaban cuatro películas, casi todas de producción estadounidense, casi sin excepción Westerns. Me sentaba junto a mi padre desde el mediodía hasta entrada la noche, los dos como ranas frente al “sol de noche”, él retornando a las series de Tom Mix a las que se colaba cuando era pibe en el barrio tanguero de Boedo y yo para estar cerca de él, de sus sueños imposibles que iban haciéndose míos y que replicaba en los juegos de indios, vaqueros, arcos y pistolas a sebita mientras corríamos por yuyales o arriba de los árboles hacia el cielo alegre de una comunidad que militaba el cambio por venir. Cuando cumplí diez nos fuimos de allí, mis padres volvieron a la ciudad, a Buenos Aires, y yo perdí el horizonte abierto y los amigos, pero obtuve la posibilidad y la cercanía de una buena formación estatal, de la cultura libresca y de la música que por esos tiempos se estaba gestando en todo el continente, el rock local, en tu propio idioma. La escuela secundaria, los primeros amores y la fe adolescente ocurrieron durante la dictadura más feroz que conoció la Argentina, la igual que el comienzo de la Carrera de Ingeniería Electrónica. Pero todo eso entró en crisis en el ’83 con el retorno a la democracia: los amores, las aficiones, el trabajo, el estudio y sobre todo el futuro. Mientras intentaba continuar con ingeniería comencé a hacer teatro, y luego de un tiempo insoportable todo se desbarató, sólo quedó la promesa redentora del escenario en un momento político pequeño y corto donde esa promesa, la redención, era el tono, el color y la forma que parecía iba a tomar el espíritu del tiempo. Obviamente no fue así. De todos modos persistí allí, en el Teatro Independiente, sin abandonar la luminiscencia de las pantallas y los proyectores, por cerca de diez años, hasta mis treinta, hasta los noventa de todos, hasta esa recaída de la que aún nos resbalamos hasta el fondo. Quise estudiar cine, pero la única posibilidad que por esa época había para mí, sobre todo por los tiempos de los que disponía, era una escuela privada sumamente costosa (Universidad de Cine, fundada por Manuel Antin). Comencé a estudiar Psicología y organicé mi vida con una mujer que no tardaría en desencadenar una patología autoinmune muy limitante. Terminé la carrera, es casi lo único que pude hacer en ese tiempo. Fuimos a España, porque ese era el único país que podría costear el tratamiento que ella necesitaba, nuestro Estado en los noventa rehuía de todo. Pude además estudiar Arte. Más de una década formándome, viendo cine, leyendo kilómetros de hojas impresas hasta que el cuerpo pidió moverse, tal como acostumbraba sentenciar mi abuela gallega: “el cuerpo te pide y hay que darle gusto”. En el 2001 me convertí en una trucha, nadando contra la corriente imparable de argentinos que salían apresurados de nuestro país. Volví el 10 de setiembre, un día antes del ataque a las torres gemelas y a tres meses del derrumbe casi terminal de la Argentina, un momento más, un ciclo de retorno a la fuga y al asesinato. Volví con Pessoa en la valija, Pessoa el portugués, mi Pessoa, el de la melancolía y la fragmentación, el Pessoa de mi país, el de los cuatro primeros versos de Tabaquería: No soy nada / Nunca seré nada / No puedo querer ser nada / Fuera de eso, tengo en mí todos los sueños del mundo. A partir de allí el cine, su luz y su sueño fueron míos también, habría que esperar una década más para cumplirlo.
– Te pregunto: cómo es hacer cine en Argentina hoy?
El cine, la realización de películas, es producto de la voluntad y el esfuerzo de mucha gente, al menos de un grupo de personas. Los largometrajes que pude realizar son consecuencia de la imaginería y el deseo compartidos de amigos, personas cercanas, por lo general algo inmunes al desaliento por el trabajo sin destino ni seguro de realización, aventureros, gente a la que no le agrada menos la ruta que el puerto de llegada. Sin eso no hay (en esta parte del continente) cine de baja producción o independiente. Aunque no todos pueden sostenerse en ese lugar indefinidamente, sobre todo en este tiempo marcado por el desempleo, la decepción y la abulia. Pero además requiere la obtención de amplios fondos (aún para el cine de muy bajos recursos) sin los que es inevitable naufragar tantas veces como las que te levantes con la voluntad dispuesta a volver a intentarlo. En Argentina contamos con un Instituto de Cine (INCAA) que es fundamental para sostener la producción de películas, pero que no siempre es el mismo. Ofrece posibilidades que determinan los gobiernos de turno, sus prioridades e intereses. El INCAA depende directamente del Poder Ejecutivo, aunque su estatuto establezca que su funcionamiento es autárquico. En el 2008 se inauguró un período distinto en la Institución y en la producción de cine. Cambió su procedimiento de selección de proyectos y se establecieron fondos nuevos destinados sobre todo (pero no únicamente) al cine documental de bajo presupuesto: hacer más películas con menos dinero por medio de productoras pequeñas o incluso por productores individuales, sin la solicitud de grandes avales profesionales, en ese momento sólo en manos de pocas empresas consagradas y sostenidas por una larga relación con el Estado. Esto fue producto de la lucha de agrupaciones y gremiales ligadas al cine, pero también de quienes estaban a cargo del Estado en ese momento, de su programa de inclusión de la producción audiovisual en un marco más amplio de promoción cultural y de tratamiento de temas y formas que atravesaban con suma dificultad la selección del INCAA, en una etapa de cierto cambio de expectativas políticas, de dirección llamémosle progresista que se estaba dando en el hemisferio sur de nuestro continente. Se estableció por ejemplo la constitución (ad hoc) de Comités de Selección, donde sus miembros, que en general forman parte de las distintas gremiales relacionadas con las distintas áreas de la producción, son elegidos especialmente para cada concurso y luego son disueltos. Cada vía de apoyo sostenida por el INCAA, correspondiente a los distintos niveles de producción tiene sus propios Comités, lo que hace difícil aunar criterios, reducir y direccionar la selección de los proyectos presentados, establecer límites morales, éticos o políticos. Es así como fue posible que yo o grupos de personas como yo pudieran acceder a la producción audiovisual. El cambio fue enorme y los resultados muy buenos, incluso medidos por algo tan superficial, pero necesario para el control estatal, como los son los premios y el acceso a Festivales de Cine. Luego está el otro gran tema, la distribución, la exhibición en sala, que es muy difícil de sostener y resolver. Es un gran problema, porque se trata de la conversión de un grupo de ideas e imágenes llevadas a lo concreto, en un objeto transable en el Mercado, con los condicionamientos y restricciones que éste tiene, donde existen determinaciones muy difíciles de franquear. Ésta dificultad ha promovido la promulgación de normas, pero han sido en general inocuas frente a las multisalas, muchas veces ligadas directamente a las distribuidoras internacionales, cuyos objetivos muchas veces están más allá de los intereses incluso de los grandes productores locales y sus películas (posiblemente) taquilleras. Para paliar esta situación el mismo INCAA ha generado un sistema de exhibición propio en todos los distritos del país, abriendo salas para asegurarse la distribución del cine que ayuda a producir. La existencia de todo éste sistema ha estructurado un dispositivo de producción muy importante, se han realizado muchísimas películas con ritmo sostenido. El cine argentino viene manteniendo un lugar de cierta relevancia en la producción internacional, se nos ha hecho posible expresar nuestros problemas y nuestras historias y se ha generado toda una nueva camada de pequeñas productoras y sus temas y formas que difícilmente hubieran podido existir fuera de este marco. En este punto el Estado, su presencia, su programa de fomento y de delegación externa e independiente de selección de proyectos, es fundamental. Como en todas las políticas públicas hay límites y algunos desvíos, pero aun así sigue siendo un camino promisorio que es necesario sostener y profundizar.
– Qué es El Arca de Medusa y cómo eso ha empezado?
El Arca inició en el 2001, a mi regreso de España. Comencé a dictar clases de fotografía en diversos Centros Culturales de la Ciudad de Buenos Aires, primero el CC San Martín, luego en el CC Recoleta y finalmente el CC 25 de Mayo, todos bajo la administración de la Ciudad. Las posibilidades de exhibición en estas Instituciones de las imágenes de los cursantes eran exiguas, una semana al año en unos pocos metros de pared. Era un tiempo sin redes sociales y sin fotografía digital. Decidí entonces diseñar una página WEB donde albergar y publicar en forma permanente la enorme cantidad de fotos que se fueron acumulando en la medida que las clases avanzaban. Así cada cursante podía “linkear” a sus contactos su propio trabajo, pero también el de sus compañeros. Me propuse desde el comienzo articular imagen y poesía, y en las clases, sobre todo las de “Hacer Obra”, uno de los seminarios que dictaba con un perfil clínico autoral, donde las series se conectaban con textos poéticos que también eran publicados en el mismo sitio, El Arca de Medusa. En ese mismo espacio pude también ir alojando mi proyecto, el que había traído de España, el de rodar una película sostenida sobre la Obra de Fernando Pessoa. Muchos de los que participaron en esos talleres me acompañaron en ese camino, y con algunos de ellos logramos realizar la película y estrenarla a fines de 2015.
– Acerca de la película Paraíso – Una historia de Heterónimos: cuál es tu relación con la obra de Fernando Pessoa? Hable un poco de cómo se generó esa idea y de la producción de la obra como un todo. Además, fue de alguna manera posible hacer con que la peli fuera transmitida para países hablantes del portugués?
A Pessoa, a algunos de sus textos, los conocí promediando los ’80. Participé bajo la dirección de Alejo Piovano de un espectáculo poético que se llamaba “Estrellas, Pan, Bibliotecas”. Uno de los textos incluidos en la puesta era Tabaquería, un poema escrito muy cerca de la muerte de Don Fernando en 1935, bajo el heterónimo de Álvaro de Campos. El texto quedó allí, sólo volví a él o a otros del escritor luso por placer hasta el 2001. En ese momento, excedido, sin mucho que esperar ni camino por recorrer, esperando la salida del tratamiento de rehabilitación, de quién era mi compañera en esa época en un bar de tapas de la Ciudad de Granada, Pessoa se me incrustó en el puño y empujó mi sensibilidad por la década siguiente. Anduve durante largo rato tironeado entre la identificación y la repulsión a la Obra y su gesto. Me obsesioné, leí todo lo que pude, ensayos, la propia Obra, el “Drama em gente”, esa operación teatral de desdoblarse en innumerables personajes, esa cofradía de heterónimos, los poetas que son Fernando, aunque ninguno sea él. La idea de que del otro lado de las palabras nos hay una vida, hay un personaje, que todo se vacía, se convierte en literatura, me pareció que podía volverse la imagen de ésta época, pero sobre todo de la mía, y después de un tiempo, de la de mi comunidad. Un mundo sin fondo ni trascendencia, donde sólo pululan personajes, un mundo de lúcidos agarrotados por la melancolía, obligados a repetir palabras e ideas impropias, pero que al mismo tiempo son su más íntima consistencia. Un mundo sin historia, o como se nos viene presentando, al final de ella: un montón de títeres abandonados juntos en el escenario, pero profundamente solos, cada uno con sus hilos desflecados. Mi intención desde el comienzo fue poner en problemas esto, mi identificación con la Obra. Restituir en el relato algo del orden vital, histórico, habilitar la posibilidad de pensar en justicia, en ética, limitar la voracidad de la melancolía que busca tragárselo todo. La película es una historia de heterónimos, de personajes, de un autor que también se reduce a su propia letra, abandona la vida para perderse en el sueño, tal como Pessoa le recomendaba a los jóvenes que lo escuchaban o leían en un país que había perdido el brillo y la gloria de los siglos XV y XVI. Era una sombra de eso en la primer mitad del siglo pasado. El mundo era de los otros europeos, quedaban solos los versos de Camoes y el fado que hacía temblar lo añorado al ritmo de los redoblantes de la dictadura de Salazar. Y eso lo ponía muy cerca de la Argentina, de su presupuesto constantemente negado, de su mito de origen nunca cumplido, de su estirpe tanguera y nostálgica a los saltos entre golpe militar y golpe militar desde los años ’30. Una comunidad que faltó a la cita, que se perdió, al igual que Don Sebastian, el mítico rey portugués desaparecido en batalla, pero vivo en los corazones de los que aún lo esperan. Pessoa lo trae en Mensaje: ¿Qué importa el arenal y muerte y desventura si con Dios me guardé? Es lo que soñé que eterno dura, Ése regresaré. PD: la película participó del Festival de Avanca en Portugal, pero siempre fue difícil (hasta ahora imposible) que una productora local se interese en su distribución en ese país. Tampoco en Brasil.
– De dónde vino la idea para el documental Hacerlo Todo? Por qué fue importante acercarse del tema de la Psiquiatría Social a través del contexto del servicio Lanús en Villa Jardín?
A través de mi formación en Psicología había conocido la experiencia de “El Lanús”, el primer Servicio de Salud Mental en un hospital general en Argentina. Un espacio considerado un punto de inflexión en la práctica de esa área en buena parte del continente. Su fundador, el Dr. Mauricio Goldenberg, fue parte también del origen de la carrera de Psicología en la Universidad de Buenos Aires y del Instituto Nacional de Salud Mental. Inicia una reforma que va a ser contemporánea de la de Basaglia en Italia, pero que tiene características locales, sobre todo el hecho de darse en una época cuya intensidad política termina por convertir a todo el proyecto en una verdadera tragedia. La etapa gloriosa del Servicio va desde 1956 hasta 1976, cuando el Proceso Militar en el poder obliga al exilio a la mayor parte de sus profesionales, luego de haber secuestrado a tres de ellos, de los que sólo sobrevivieron dos. Se trató de una experiencia muy diversa y de muchos matices, que intentó incluir en sus intervenciones una idea intercausal del malestar subjetivo, sobre todo la inclinación a incorporar la dimensión social del sufrimiento, los derechos humanos y la autopercepción ética de su labor. Salud Mental también era (y es) no vivir hacinados, tener cloacas, tener vacunas, educación, esparcimiento y comprender que toda mejora viene también con la participación. Eso en el marco de una vida política que se iba desenvolviendo cada vez más autoritariamente, no podía terminar bien. Y así fue. “Hacerlo Todo” debería ser una de las tres películas que ambiciono realizar para contar la historia de “El Lanús”. La que ya pude exhibir con notable repercusión cuenta la experiencia de vanguardia del Servicio, su salida de los muros del hospital para intervenir en las barriadas pobres levantadas a la orilla del Riachuelo, un espacio de contaminación endémica. Para mí esta historia dibuja una especie de frontera entre las otras dos, las de la etapa fundacional y la de la decadencia (desde el Proceso Militar hasta nuestros días). Las tres películas pretenden plantear la dificultad de pensar los problemas subjetivos fuera de la Historia, de la política, de las ideas morales, de lo que creemos y nos proponemos ser. Desde el inicio me pareció que la historia del Servicio era una alegoría nacional, un cuento que ilustraba un derrotero de decadencia alumbrado por grandes propósitos truncados por la violencia o la desidia. Un ciclo de repeticiones interminables, de programas pilotos, de retorno a la nada. Un país con su piedrita al hombro cargándola hasta el borde por donde volverla a tirar. Un Sísifo de parodia, un modo de existir infinitamente igual.
– Las películas completas están disponibles gratuitamente en tu canal de Vimeo. Qué piensas acerca del acceso gratuito a la Cultura?
La película que está disponible en VIMEO es “Paraíso”. “Hacerlo Todo” aún se encuentra limitada por una contraseña, esperando el estreno (postergado por la Pandemia) en algunas de las salas oficiales (pertenecientes al INCAA). Mi intención es liberarla luego, aunque ya se ha proyectado durante al año pasado en más de cuarenta Instituciones ligadas a la Salud Pública. Mi preocupación es realizar películas, poder conseguir fondos para hacerlas. Cualquier forma de circulación, de exhibición, será bienvenida. Quisiera llegar hasta el último espacio donde sea posible presentarlas, sin restricciones.
– Hable un poco de la importancia de instituciones como el Centro Cultural San Martín, y de cuál es el status de la cultura del país en ese momento.
En Argentina existen varios Institutos de fomento. Ya conté sobre el INCAA, en el caso del cine, pero por ejemplo también existe la asistencia a la actividad teatral, apoyos y subsidios específicos que aseguran la posibilidad de arrendar una sala y presentar una pieza sin un riesgo excesivo. Eso hace que en Buenos Aires exista una oferta teatral inmensa, difícil de ver en otras ciudades del mundo. Los Centros Culturales y los teatros de la Ciudad intentan abordar producciones que los grupos independientes no podrían costear. Pero también han visto su actividad corroída por los imperativos económicos de los últimos años, por las restricciones presupuestarias y cierta deriva a la privatización de sus servicios. Este país no vive fuera del mundo tal como es. Y as así desde hace largo rato.
– Que artistas argentinos contemporáneos – de fotografía, cine, artes visuales, o lo que sea – recomendarías?
En argentina existen una enorme diversidad de caminos y propuestas estéticas muy valiosas. En el cine desde hace largo rato me entusiasma la Obra de Lucrecia Martel, una realizadora muy personal, inquietante, profunda y revulsiva. Como en todas las épocas el espíritu de tiempo se apodera de los corazones y los pone en fila de alguna manera, los homogeiniza. Tenemos, por suerte, algunos que pueden presentar de todos modos sus mejores disonancias. Lucrecia es uno de ellos. Lo pueden buscar por ejemplo en “La ciénaga”, “La niña santa”, “La mujer sin cabeza” o la más reciente “Zama”.
– Cuáles son tus mayores influencias?
Las influencias, las mías al menos, van cambiando con mis intereses, con los problemas que quiero confrontar. Tengo sí ciertas aperturas, cambios de timón en mi vida, que fueron decisivos, que funcionaron como puntos de apoyo para el brazo de palanca que quería ubicar para torcerlo todo y seguir por otro camino. Uno de ellos fue Mario Caponi, mi maestro de teatro. Tuve luego varios más, pero con él pude iniciar una deriva de experimentación emocional que abrió una forma nueva de abordar todo lo que vendría después. Conocí temprano el existencialismo, el teatro ruso y algo de poesía contemporánea. De allí fui al cine de Tarkovsky o del polaco Wajda, alumbrado por su lirismo y su concepción ascética de lo que se presentaba en los planos. La otra vertiente viene de mi padre, de sus sueños, de su cine, de Capra, Ford y Wilder. Al cine argentino legué más tarde, tal vez por culpa de tanta censura, mi adolescencia se la tragó el disciplinamiento social de los militares en el poder. Luego del ’83 pude recorrer más tranquilo las películas de Gleyzer, Favio o Renán. De todos modos hay una constante en la que persisto: yo imagino el cine leyendo. Leo mucho, es una especie de búsqueda constante, espero ver en las letras de los ensayos o de los poemas los cielos, los unicornios y las experiencias fabulosas que luego van a poblar mis planos. No leo para entender. Leo para imaginar.
– Cuáles son tus proyectos futuros?
Como mencioné más arriba quiero terminar las dos películas restantes para contar la historia del Servicio fundado por Goldenberg. Es una epopeya de más de sesenta años de historia argentina. Veremos luego de la Pandemia qué Instituto de Cine tenemos, y de qué forma podrá acompañar nuestros proyectos. También quiero volver a la ficción, que es el registro que siento me ofrece un grado mayor de libertad. Tengo una historia sobre la que estoy trabajando, podría llamarse “La memoria”, un intento de poner en problemas su existencia junto a la justicia.
– Que pregunta te gustaría responder y nunca te la hicieron?
Más que responderlas me gustaría formularlas, intentar promover dialéctica, negativizar ideas y formas, generar movimiento. Creo que el cine, su poder poetizante y su posibilidad de llegada masiva puede aportar mucho a la historia por hacer.