Neste mês, conheça Beatriz Cajé, artista sergipana cuja obra percorre os limiares entre as artes visuais e a poesia. Suas pinturas, formadas por impactantes texturas e enormes camadas de tinta, já ilustraram periódicos como o RelevO, o Jornal Rascunho e o Cândido. Confira esse lindo trabalho e seus textos abaixo!
* fotografias das obras pela artista visual Júlia Cajé
Todas as cicatrizes do mundo
Existir tem tanto sentido quando masturbar um pássaro morto
sinto que nossa idade pode ser medida em sofrimento
em quantas pessoas vemos morrer
em quantos anos demoramos para ouvir
uma borboleta falando
as batidas dos cílios durante um desabamento
o percurso de um pássaro
antes de ser esmagado
ou em quantas lágrimas um corpo pode derramar
durante um naufrágio
não há nada que me faça chorar
lágrimas são como areia fina
custam a sair do corpo
não sei quantos anos cabem nos meus
mas tenho este tremor nas mãos
verifico o gosto de amytril no céu da boca
encontro uma rachadura
um feixe de luz
entre o mar de areia
e o abismo
enterro os meus pés.
Via crucis
Xícaras manchadas de batom
numa manhã quente
quero ser inundada com fumaça
mas só abro a janela
e perto da palmeira
está um pássaro destroçado
imóvel
uma das patas está quebrada
seus olhos abertos
cheios de morte
enquanto bebo meu café
e espero a minha vez.
Beatriz Cajé é uma poeta e artista plástica autodidata nascida em Sergipe, em 1997. A linguagem mais íntima de Beatriz é a pintura a óleo, embora suas obras dialoguem com a tridimensionalidade escultórica. O exagero, a rapidez e a sobreposição de dezenas de camadas de tinta a óleo extrapolam o limite da superfície pictórica. Todas as suas obras são o resultado da conexão entre imagens encontradas na literatura e questões sobre a morte que a artista carrega.
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