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“Um filme, um sentimento”: Rumble Fish, Francis Ford Coppola (1983)

“O garoto da moto reina”

Bad boys, brigas, becos sem saída escuros com feixes de luz, bares, bilhares, álcool, ecos, vozes em planos distantes, sombras e o tempo que marca o relógio. Nas nuvens difusas que nos hipnotizam, nos envolvem, e personagens complexos e cativantes. Metáforas e símbolos nesse maravilhoso filme (hoje cultuado) em preto e branco e ao estilo policial noir, do nosso querido Francis Ford Coppola.

Ambientada nos anos 50, como no romance original, esta história de brigas e nostalgias pelas épocas de gangues é mais que a busca por ser alguém no povoado de Tulsa, Oklahoma. Com uma bela fotografia e atmosfera de sonho e mistério, Coppola nos deleita com inserções em time lapse, onde o tempo se vê refletido ao pôr-do-sol nos edifícios, nas sombras de escadarias e no céu. Por momentos também flutuamos junto dessas imagens etéreas do céu e das nuvens, e logo descemos às obscuridades da cidade, dos becos, dos bilhares, do álcool, da heroína, do sexo e do ego.

Tudo é difuso, uma recordação ou uma sensação em Rumble Fish. O tempo, a neblina nas ruas, com as nuvens movendo-se lentamente. Chega a parecer um sonho, ou um flashback. As conversas são como ecos do passado. Apenas ouvimos de perto e no primeiro plano, a voz em sussurro e com muita presença do Garoto da Moto.

Seus personagens errantes e misteriosos nos implicam com seus sentimentos e pensamentos. Suas profundas e íntimas interrogações. Reflexões que nunca se expressam em palavras, algo muito parecido ao cotidiano.

Quem expressa seus sentimentos ou pensamentos a cada instante? Apenas os loucos compreenderiam ao Garoto da Moto.

Rusty James carrega a imagem de ser um garoto mau e idolatra a seu irmão por ser “a lenda viva” entre os jovens da cidade. Carrega a dicotomia de querer “ser alguém” sem saber o por quê. Diante de seus amigos, impõe-se como líder; diante de sua namorada e/ou da sociedade, é alguém que não pode oferecer nada.

O garoto da moto tem estilo e tem força, é atrevido (igual ao que diz o argumento) e é tudo o que Rusty está buscando. É enigmático, poderoso, e o conhecemos mais pelo que os outros falam dele. Para alguns um louco, para outros um príncipe.

O enigma e a aura de mistério de seu irmão, herói e anti-herói ao mesmo tempo, estigmatiza e deixa Rusty James perplexo. O sofrimento de não compreender seu irmão e querer segurá-lo é uma constante. A fraternidade, a lealdade e o mistério se manifestam uma vez mais nas temáticas recorrentes da filmografía de Francis Ford. É a humanidade que se reflete numa história entre irmãos, tão simples, pessoal e passional como a própria vida.

Como não nos sentirmos identificados com Rusty James ou o Garoto da Moto? Se o tempo corre e não sabemos o que fazemos aqui na maioria do tempo.

O Garoto da Moto chega no momento decisivo, “como aquele que, assim, chega”, um ser iluminado que retorna do enigma de seu destino e recria a lenda viva que a ele é atribuída. Poderia ser comparado a um Jesus ou a um Buda que regressa para guiar seus irmãos e amigos, confusos e aturdidos no mar das pancadarias, da nostalgia, dos vícios e das banalidades. O que busca o garoto da moto? O que busca Rusty James? O relógio segue marcando a hora e, como diz o bartender do Benny’s, “o tempo é estranho, quando se é um menino o tempo sobra em abundância, desperdiça-se o tempo, aquí e ali…”

Por um lado o Garoto da Moto sempre viu o mundo de forma diferente. Para ele, o mundo está em preto e branco, exceto pelo que seja profundo e importante. Já não precisa das brigas, nem ser Robin Hood ou o Flautista de Hamelin, como ele mesmo afirma. O contemplativo Garoto da Moto encontrou a verdade, ou algo parecido a ela, e isso é o que o torna ainda mais especial.

Por outro lado, Rusty James apega-se com todas suas forças às convenções que o aprisionam: “ser uma lenda”, “que os outros te respeitem”, “ego”, “honra”, etc. Convenções e ataduras machistas e sociais que a própria sociedade se autoimpõe.

O tempo corre, se escuta a gota que cai lentamente e o Garoto da Moto está cada vez mais distante. Sempre acima ou afastado nos planos e cenas, sempre com sua expressão serena e alienada, com seu sorriso que contém as respostas.

“Com quem briga Rusty James?”, ele pergunta a seu irmão, e o silêncio se faz presente. Talvez as tentativas de sairmos de nossas próprias tendências negativas e repetitivas não se possam expressar tão facilmente. E isso o Garoto da Moto já sabe. Sabe que há um longo caminho até o propósito e a liberação. Sabe que ao indagar e falar francamente com seu irmão, não encontrará resposta, mas sim deixará uma porta, um rumo até o mar e até muito mais. Também sabe que sua representação nesse mundo, como lenda e rei das convenções e contradições já terminou. Compreende que os peixes de Sião significam muito mais que simples peixes que lutam num aquário, e pode discernir perfeitamente que ele encarna o próprio aquário de seu próprio irmão.

Como todo messias, ele espera o momento certo para transmitir a sua sabedoria. E só expressa de maneira inicial na livraria: “Se queres guiar às pessoas, tens que ter uma meta.”

O relógio é gigante agora e a polícia e os mandatos socioeconômicos observam-nos muito de perto. A última advertência, a última façanha e ensinamento se aproximam.

Rusty James luta, sofre e compreende cada vez mais que o que queria já não existe. Ele não é o seu irmão, nem o líder de seus amigos, nem o tonto que acredita ser. O garoto da moto se prepara para seu último grande golpe na última sequência do escape dos Rumble Fish. O amor fraternal de devoção e redenção se fusionam como uma cerimônia. De repente se escuta um disparo impactante e a lenda do Garoto da Moto permanece perpetuada para sempre. Imortalizando seu reinado nos corações das pessoas e admiradores da cidade, em seus amigos, em seu pai, em seu querido irmão, permanece gravado como símbolo do frescor, da lembrança do que viemos fazer aqui, como propósito, ou como meta, mártir, herói, louco, sacrifício.
Como tudo o que não deve ser nem será.

O Garoto da Moto reina por sua entrega e seu amor.
Ou haverá algum ato maior de amor do que o da liberação?

 

To my dear and mystics friends Gabriel and David,
thank you for recommending this wonderful movie.


Filme Completo:


 

Versión en Español

 

“El chico de la moto reina”

Bad boys, peleas, callejones sin salida oscuros con ráfagas de luz, bares, billares, alcohol, ecos, voces en planos lejanos, sombras y el tiempo que marca el reloj. Las nubes difusas que nos hipnotizan, nos envuelven y personajes complejos y atrapantes. Metáforas y símbolos en esta maravillosa película (hoy de culto) en blanco y negro y al estilo del policial negro, de nuestro querido Francis Ford Coppola.

Ambientada en los años 50, como en la novela original, esta historia de peleas y nostalgias por la épocas de bandas es más que la búsqueda de ser alguien en el pueblo de Tulsa, Oklahoma. Con una hermosa fotografía y atmósfera de sueño y misterio, Coppola nos deleita con unos insertos en time lapse, donde el tiempo se ve reflejado en las puestas del sol en los edificios, sombras de escaleras y el cielo. Por momentos también flotamos junto a éstas imágenes etéreas del cielo y las nubes y luego bajamos a las oscuridades de la ciudad, de los callejones, de los billares, del alcohol, la heroína, el sexo y el ego.

Todo es difuso, un recuerdo o una sensación en Rumble Fish. El tiempo, el humo en las calles, con las nubes moviéndose lentamente. Se percibe como un sueño o flashback. Las conversaciones son como ecos del pasado. Solo oímos de cerca y en primer plano, la voz en susurro y con mucha presencia del Chico de la Moto.

Sus personajes lumpenes y misteriosos nos implican con sus sentimientos y pensamientos. Sus profundas e íntimas interrogantes. Reflexiones que nunca se expresan en palabras, algo muy parecido a lo cotidiano.

¿Quien expresa sus sentimientos o pensamientos en cada instante? Solo los locos comprenderían el Chico de la Moto.

Rusty James arrastra el emblema de ser un chico malo e idolatra a su hermano por ser “la leyenda viva” entre los jóvenes de la ciudad. Conlleva la dicotomía de querer “ser alguien” y no se saber por qué. Frente a sus amigos se impone como líder, frente a su novia y/o la sociedad es alguien que no puede ofrecer nada.

El chico de la moto tiene estilo y tiene fuerza, es atrevido (al igual que el argumento) y es todo lo que Rusty James está buscando. Es enigmático, poderoso, y lo conocemos más por lo que los otros dicen de él. Para algunos un loco, para otros un príncipe.
El enigma y el halo de misterio de su hermano, héroe y antihéroe a la vez, estigmatiza y deja perplejo a Rusty James. El sufrimiento de no comprender a su hermano y querer retenerlo es una constante. La fraternidad, la lealtad y el misterio se manifiestan una vez más en las temáticas recurrentes en la filmografía de Francis Ford. La humanidad misma que se refleja en una historia entre hermanos, tan simples, personales y pasionales como en la vida misma.

¿Cómo no sentirnos identificados con Rusty James o el Chico de la Moto? si el tiempo corre y no sabemos qué hacemos aquí la mayoría del tiempo.

El Chico de la Moto llega en el momento justo “como el que así llega”, un ser iluminado que vuelve del enigma de su destino y recrea a la leyenda viva que se le asigna. Podría compararse como un Jesús o Buda que regresa a guiar a sus hermanos y amigos, confundidos y aturdidos en el mar de las peleas, la nostalgia, los vicios y las banalidades. ¿Qué busca el chico de la moto? ¿Qué busca Rusty James? El reloj sigue marcando la hora y como dice el bartender de Benny’s, “el tiempo es extraño, cuando uno es niño el tiempo sobra en abundancia, uno desperdicia el tiempo, aquí y allá…”

Por un lado el Chico de la Moto siempre ha visto el mundo de forma diferente. Para él, el mundo es en blanco y negro, excepto lo profundo e importante. Ya no necesita de las peleas ni ser Robin Hood o el Flautista de Hamelin, como él mismo afirma. El contemplativo “Chico de la Moto” ha encontrado la verdad o algo parecido a ella y eso es lo que lo hace aún más especial.

Por otro lado, Rusty James se aferra con todas sus fuerzas a las convenciones que lo aprisionan: “ser una leyenda”, “que los demás te respeten”, “ego”, “honor”, etc. Convenciones y ataduras machistas y sociales que la misma sociedad se autoimpone una y otra vez.

El tiempo corre, se escucha la gota que cae lentamente y El chico de la moto está cada vez más distante. Siempre arriba o alejado en planos y escenas, siempre con su expresión serena y alienada con su sonrisa del que sabe las respuestas.

“¿A quién le peleas Rusty James?” le pregunta a su hermano y el silencio se hace presente. Quizás los intentos por salirnos de nuestras propias tendencias negativas y repetitivas no puedan expresarse tan fácilmente. Y eso el Chico de la Moto lo sabe. Sabe que hay un largo recorrido hacia el propósito y la liberación. Sabe que al indagar y hablar francamente con su hermano, no encontrará respuesta, pero sí dejará una puerta, un rumbo hacia al mar y hacía mucho más. También sabe que su representación en este mundo, como leyenda y rey de las convenciones y contradicciones ha terminado. Comprende que los peces de Siam significan muchos más que simples peces que luchan en una pecera y puede discernir perfectamente que él encarna la propia pecera de su propio hermano.

Como todo mesias espera el momento indicado para dar rienda a su sabiduría. Y sólo expresa de manera temprana en la librería: “Si quieres guiar a la gente, tienes que tener una meta”.

El reloj es gigante ahora y la policía y los mandatos socioeconómicos los miran muy de cerca. La última advertencia, la última hazaña y enseñanza se aproximan.

Rusty James lucha, sufre y comprende cada vez más que lo que creía ya no es. Él no es su hermano, ni el líder de sus amigos, ni el tonto que cree que ser. El chico de la moto se prepara para su último gran golpe en la última secuencia del escape de los Rumble Fish. El amor fraternal de devoción y redención se fusionan como una ceremonia. De repente se escucha un disparo impactante y la leyenda del Chico de la Moto queda perpetuada para siempre. Inmortalizando su reinando en los corazones de las personas y admiradores de la ciudad, en sus amigos, en su padre, en su querido hermano, queda plasmado como símbolo de la frescura, del recuerdo de lo que venimos a hacer aquí, como propósito, o como meta, mártir, héroe, loco, sacrificio.
Como todo lo que no debe ser ni será.

El Chico de la Moto reina por su entrega y su amor.
¿O hay algún acto más grande de amor que el de la liberación?

 

To my dear and mystics friends Gabriel and David,
thank you for recommending this wonderful movie.

Ayelen Indra Lago
Licenciada em Cinematografia e Técnica Audiovisual pela Universidad Nacional de Tucumán, Argentina. Também tem formação nas áreas de Teatro e Dramaturgia. Diretora no projeto de Documentário "Pozo Vacante", vencedor da Bolsa de Criação 2018 do Fundo Nacional das Artes da Argentina. Atua principalmente como realizadora em tempo integral e como docente em cursos de cinema para jovens e adultos. Também colabora com vários projetos artísticos e audiovisuais de Tucumán.

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