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“Este texto já estava começado há algum tempo e nada de evoluir porque emperrado. E emperrado porque 2016 – essa explicação basta, não?”
[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row][vc_column][vc_column_text]Ouço diariamente no muro das lamentações da escrita um tanto de desculpas para quem não consegue escrever, ainda que uma merda, ainda que um frankenstein textual – e incluo-me aqui como um proficiente exemplo disso. Vejam com seus próprios olhos:[/vc_column_text][vc_column_text]
3/10/2016 16:12
Vinicius Ferreira Barth
oi, Julie, tudo bem? recebi teu e-mail, respondo ainda hoje.
mando essa mensagem aqui por outro motivo. estou tentando fechar a edição desse mês da R.Nott. quer estrelar a coluna de literatura com um texto?
3/10/2016 16:13
Julie Fank
Oi, Vinicius. Tudo bem? Ah, legal. Claro, claro. Qual é o meu prazo? Beijo!
3/10/2016 16:16
Vinicius Ferreira Barth
Até, no máximo do máximo, dia 15. o tamanho é livre, mas gostamos de um mínimo de 4.000 caracteres – com espaço.
3/10/2016 17:10
Julie Fank
Perfeito! =)
[/vc_column_text][vc_column_text]Mea culpa feita, hoje é dia 06 de novembro e, depois de ignorar ferozmente todos os excedentes de prazo cedidos pela equipe editorial e apesar das chamadas de atenção do editor para a perda de credibilidade que o atraso com o texto logo na primeira coluna geraria com os possíveis leitores [Vinicius chegou a enviar o protocolo de pedido de inserção da saudosa ferramenta de chamada de atenção do msn para o Zuckeberg (já em análise)], cá estou em processo de escrita com um óleo de peroba bem bonito em estoque para enviar o e-mail com a coluna sobre, tcharãm, escrita. E procrastinação, óbvio. Pensei em falar sobre alguns pontos:[/vc_column_text][vc_column_text]1. Sobre começos: Este texto já estava começado há algum tempo e nada de evoluir porque emperrado. E emperrado porque 2016 – essa explicação basta, não? Curiosamente, a palavra emperrado, se trocarmos os erres por um zê, se transforma em empezado – a palavra em espanhol para começado. É também a dúvida de nove em cada dez alunos que se matriculam em cursos de gramática: empecilho ou impecilho? Ao contrário do que todo mundo pensa, não é só associar a pedra no meio do caminho (vem cá, Drummond!) a impedir. Empecilho vem de empeçar, ou seja, colocar uma peça como obstáculo. Também a mesma pronúncia de empezar: começar. Pois bem, empecemos.*
2. Sobre experiências: Semana passada, estive com alunos de um projeto de fotografia para novas mídias para falar sobre texto e processos escritos. Para eles, era fácil pensar imageticamente, gestualmente e fotograficamente. Mas daí para o texto o caminho é um pouco tortuoso. Quando perguntei oralmente para eles que adjetivos eles atribuiriam a seus projetos fotográficos, a previsibilidade tomou conta: tocante, inquieto, instigante, minimalista. É difícil se distanciar de sua produção e cada um ali dizia o que o seu projeto pretendia ser, mas ainda não necessariamente era. O primeiro exercício foi simples e associado a outro, não tanto. Além de terem trazido de casa um objeto inusitado [vide foto abaixo] a pedido da professora, vulgo eu, cada aluno precisaria escolher um objeto mais próximo daquilo que fotografa para caracterizar – e isso não tinha nada a ver com o objeto. Um aluno que fotografa lugares abandonados e sujos, por exemplo, escolheu um bueiro. Que tipo de adjetivo um bueiro leva? Sujo, corroído, abandonado, ácido, escuro. Dizer que uma fotografia é escura, por exemplo, acontece. Agora falar que alguém é crocante ou quebradiço salta aos ouvidos. E funciona. Quando brincamos com o deslocamento semântico desses adjetivos, ficou mais claro o que cada um queria fazer e dizer com seus ensaios. Um buscava um trabalho corroído, outro, um trabalho oceânico, um terceiro, um trabalho silencioso. E não paramos nos adjetivos. Alguém sugeriu que sua fotografia era uma conta de luz – inconveniente e periódica. Outro buscava uma fotografia meio rua sem saída. E por aí foi.[/vc_column_text][vc_single_image image=”3785″ img_size=”large” alignment=”center”][vc_column_text]3. Sobre marca autoral: A segunda etapa do processo, depois de outros exercícios e referências, foi analisar a marca autoral que cada um já havia imprimido nas fotos que havia tirado e que faziam parte do projeto. Eram claras para eles, que já tinham passado por um processo rigoroso de seleção para estarem ali, suas preferências temáticas, suas habilidades técnicas e que aplicativo e funções deveriam usar para trazer uniformidade às suas séries. E se isso estava claro, havia ali uma clareza de processo – ainda que não houvesse clareza sobre ter clareza sobre o processo, entende? Bem, a ideia era que cada um elencasse 10 passos para chegar às suas fotos por meio de um manual de instruções técnico-poético deles para eles mesmos. Desde Fotografe saudades até a angulação perfeita do posicionamento do celular, todo mundo chegou a um conjunto de dez passos para a produção de suas próprias fotos. Algo como se-você-não-estiver-mais-aqui-ou-perder-a-memória-explique-como-fazer. A partir disso, eles mesmos recolheram seus objetos e tiveram que executar os passos determinados tendo o objeto como uma restrição oulipiana. Teve ensaio sensual com coelho de pelúcia até. Foi ali que chegamos a algumas impressões sobre a marca autoral de cada um – ainda que as escolhas temáticas, por questões de restrição, tenham sido preteridas, poderíamos colocar todas as fotos tiradas em um varal sem necessidade de identificação e os colegas reconheceriam que foto era de quem.
4. Sobre [auto]manuais: Por mais que se estabeleçam restrições de ferramenta, prazo e forma, a marca autoral permanece: a maneira como cada um sai do labirinto criado de si para si mesmo é única, pessoal e intransferível – e toda e qualquer oficina de criação artística, literária ou não, ainda que queira, não consegue adestrar, uniformizar ou padronizar. O papel de uma oficina de criação é propiciar um espaço de investigação de processo, do próprio processo, e fazer o escrevente entender um pouquinho de seu movimento de criação por meio de uma percepção orgânica de seu potencial criador e de suas limitações – e não fazê-lo chegar num resultado mecânico. O resultado é sempre uma coreografia executada na hora, mas saber os passos criados para o momento em que a música toca ajuda a fazer o espetáculo acontecer. É jazz também. Só chega no improviso quem domina a técnica, ainda que intuitivamente. Não há manual, nem regra, nem receita – e qualquer um pode escrever, assim como qualquer um pode fazer arte. Desde que esteja disposto a escrever seu próprio manual. E revisá-lo a cada projeto.
5. Sobre fins que não se esquecem dos começos: *Em espanhol, o imperativo de começar no plural leva cê em vez de zê na grafia. É uma das formas irregulares do idioma. Justamente essa. Me despeço aqui com essa próclise indevida de acordo com os manuais gramaticais porque tenho um texto para entregar dia 09. Esses prazos tão meio conta de luz, vou negociar o vencimento para o dia 10.
6. Sobre pequenas obsessões que impedem que a gente entregue um texto: Sete é um bom número? Eu moro em andar ímpar então… (?). Que texto meio rua sem saída. Tomara que a revista aceite.
7. Sobre referências: Li hoje o livro Grapefruit – O livro de instruções e desenhos da Yoko Ono. Há algo sobre peças lá. Achei bonito, silencioso e oceânico. Ela acertou até a data:
Peça Vênus de Milo
Distribua pequenos pedaços para as pessoas que vêm vê-la. Peça a elas para poli-los em casa. Diga-lhes para trazê-los de volta depois de cinquenta anos para armar a Vênus novamente.
Primavera de 1964
8. Sobre o próximo passo: Se eu trocar algumas letras no scrubble, eu consigo transformar a palavra empeçar em encerrar? (Challenge accepted.)
Nota mental: No próximo texto, comentar sobre slogans fictícios e plantas que não morrem. E jardineirxs.
Nota mental2: Regar alguns textos quando chegar na escola. Amanhã é segunda-feira, eles vão precisar.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row][vc_column][/vc_column][/vc_row]
Interessante, com conteúdo, divertido… Bem legal!