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Quem tem medo de Galerias?

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“Uma vez entrou uma pessoa na galeria que não sabia a diferença entre um museu e uma galeria de arte. Uma vez entrou uma pessoa na galeria que pensava que para as obras estarem expostas o artista deveria estar morto.”

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           “Uma vez entrou uma pessoa na galeria que não sabia a diferença entre um museu e uma galeria de arte. Uma vez entrou uma pessoa na galeria que pensava que para as obras estarem expostas o artista deveria estar morto. Uma vez entrou uma pessoa na galeria que parou diante da imagem de um jardim de rosas e o seu semblante mudou de cor. Parafraseando Artaud: se a arte imita a vida então vamos levar a vida para a arte.”

 

             A frase acima nos foi contada pela Galeria Farol Arte e Ação, daqui de Curitiba, quando perguntamos a eles a respeito do público que passa pelo espaço. Oras! Nós, que na verdade sabemos tão pouco sobre arte, nunca teríamos chegado a provocações tão magníficas. Yoko Ono, numa ocasião qualquer, disse que a coisa mais legal de uma galeria de arte é que pode-se visitá-la apenas para olhar, mesmo sem ter um centavo no bolso.

 

             Sem nos darmos conta, percebemos que a Galeria de Arte é um lugar de acesso democrático, coisa da qual nos esquecemos quando condenamos esse tipo de estabelecimento por seu caráter comercial. Dentro da galeria é tão importante a venda quanto é o movimento, a circulação e o nascimento de diálogos e novas ideias. É justamente na galeria que podemos entrar livremente e apreciar – sem compromissos, diria o vendedor – as obras ali expostas.

 

             Pelo lado dos museus, vemos que não é toda instituição que facilita o público acesso, mesmo quando são públicos. Vemos isso, por exemplo, quando pensamos no Museu de Arte de São Paulo – MASP, que cobra alguns não-módicos 25 reais pela visita. Aqui em Curitiba, no Museu Oscar Niemeyer – MON – a visita sai atualmente por 12 reais. Contrastando com essa situação, vemos o Museo Nacional de Bellas Artes – MNBA, o mais importante da Argentina, de entrada sempre gratuita. Podemos manter essas informações guardadas no fundo da mente enquanto avançamos por esse texto.

 

             Mas por que tocamos nesse assunto? Porque uma das diferenças básicas entre o museu e a galeria de arte está justamente no acesso. Sabemos que as galerias têm e funcionam com um pensamento fundamentalmente comercial – os mais maldosos ou puristas condenam esse funcionamento – e também fundamentalmente contemporâneo. As novidades não só tentam atrair os possíveis compradores como movimentam uma faixa importante do cenário artístico atual, que é a arte do agora, de artistas novos que estão na ponta da produção contemporânea e que querem conquistar seu espaço, seu público e seu dinheiro. E o que o acesso tem a ver com esse assunto? Tudo. A galeria te quer lá dentro e não te cobra por isso. Você pode acabar comprando alguma coisa, mas mais do que isso, você traz movimento, e o movimento é o elemento básico de funcionamento da galeria. Sadie Jones diria que a arte é inspiradora, e que o tipo de excitação que te atinge quando se entra numa galeria não tem nada a ver com a aquisição de um trabalho.

 

             Ao pensar sobre as diferenças entre o espaço da galeria e o espaço do museu, Neil MacGregor disse que é no primeiro que acontece uma atividade de contemplação puramente estética. Ou seja, de tentativa de apreciação e compreensão do novo, produzido por uma pessoa da qual nunca se ouviu falar. Na galeria a contemplação fugiria do aspecto biográfico, enquanto a atividade no museu seria a de “entrar na vida de outra pessoa através de um objeto”, numa apreciação carregada de História e de Biografia. Construiu-se aqui uma oposição entre um espaço do futuro e um espaço do passado. Embora seja uma frase que pudéssemos discutir, deixo-a para uma reflexão posterior.

 

             Nós conversamos com dois espaços curitibanos para escrever essa reflexão sobre o espaço da galeria: a já citada Galeria Farol Arte e Ação – localizada no centro da cidade, no complexo da Bicicletaria Cultural, próximo à badalada, revitalizada e boêmia rua São Francisco – e a Diretriz Arte Contemporânea – localizada dentro do Shopping Pátio Batel, que é lembrado, acima de tudo, pelo alto nível socioeconômico. Embora pareça que são lugares completamente distintos numa primeira vista, é evidente o objetivo compartilhado pelos dois espaços: movimento.

 

             É de se esperar que grande parte dos visitantes da Diretriz seja de nível sociocultural alto, dado o público alvo do shopping. Embora a opulência deste possa ser um obstáculo para a maioria das pessoas, a galeria está ali dentro, aberta para os visitantes e com as vitrines cheias de informação. Se olhamos impunemente para as calças em promoção da C&A, por que não olhar também impunemente as vitrines com obras de arte? Se você sente um tremendo embaraço apenas em se imaginar entrando nas lojas da Burberry ou da Prada – pois eu sinto – vá buscar essas obras e olhe de maneira descarada. A galeria te convida, deseja a visita e a apreciação dos trabalhos ali expostos. E isso vai além da compra, isso é movimento. A própria Diretriz nos disse, inclusive, que boa parte do seu público não é acostumada a frequentar espaços de arte. Se o museu não vai até o público, por que não uma galeria ir até o shopping? Ponto para eles, que recebem, vendem e circulam, e também garantem a continuidade do trabalho dos seus artistas, muitos deles jovens buscando seu primeiro reconhecimento.

 

             E por que não vermos a galeria também como uma atividade de descoberta? A Farol, beirando o centro histórico, intenta investigar, discutir e reunir esse valioso círculo artístico, enriquecendo um espaço que poderia estar, como tantos outros na cidade, entregue às mazelas de um centro sofrido. A própria galeria diz: “Todo centro é rico.”

 

             Quando perguntamos à Farol sobre seus compradores, veio uma resposta que parece definir, afinal, o trabalho de toda boa galeria: “As pessoas que adquirem obras na Farol identificam no gesto de aquisição uma garantia de continuidade na produção do artista contemporâneo. Sabem que os recursos da aquisição de um desenho que agora está na tua parede significou imediatamente material de trabalho, tinta, tela, equipamento no atelier daquele artista. A Farol é comprometida com a produção e o agenciamento desta memória.”

 

             Mesmo que ainda breve e ainda rasa, nossa coluna tenta incentivar o caro leitor a buscar os seus espaços e descobrir as suas galerias, mesmo que se localizem em espaços tão distintos entre si como é o caso das galerias que citamos acima. Ir até lá, incomodar, circular, ver e pensar na arte que se faz e se vende nesses dias. O neozelandês Justin Paton, em seu programa How to look at a painting, reforça a importância desse tipo de visita para que nos atualizemos sobre a produção corrente. Não se deve deixar intimidar por uma galeria. Ela quer apenas vender e sobreviver, tal como os artistas que dependem dela. Mas ela também quer conviver. E, tal como em qualquer outra loja, você não é obrigado a comprar o que ela mostra – bom, talvez te façam careta lá na Prada.

Né?

 

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“Eu vejo de 30 a 40 exposições em galerias toda semana, e não importa como está o meu humor nem quão péssimo é o trabalho: eu sempre saio me sentindo melhor. Posso aprender tanto com a arte ruim quanto com a boa.”

Jerry Saltz

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“Você tem que investir no mundo, tem que ler, tem que ir a galerias, tem que descobrir os nomes das plantas. Você tem que começar a amar o mundo e saber a respeito do gênio da raça humana. Nós somos pessoas incríveis.”

Vivienne Westwood

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Vinicius F. Barth
Doutor em Estudos Literários pela UFPR. Tradutor das Argonáuticas de Apolônio de Rodes. Escritor e ilustrador. Autor do livro de contos 'Razões do agir de um bicho humano', (Confraria do Vento, 2015) e do livro de poemas e ilustrações '92 Receitas Para o Mesmo Molho Vinagrete' (Contravento Editorial, 2019). Ilustrador de Pripyat (Contravento Editorial, 2019). Estudante de saxofone.

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