[vc_row][vc_column][vc_column_text]Eduardo Karas, colunista convidado para produzir o Ruído deste mês, trata desse tremendo assunto que às vezes aparece nas nossas páginas: existe atenção e existe pensamento quando toda a música do mundo te invade de maneira tão instantânea e discrepante? Antes de conferir o seu facebook, leia e pense sobre isso.
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“Sou da velha guarda. Conservo um respeito catedrático pela música. Não gosto nem de mudar de faixa – se você apertou o play, é para ouvir até o final. Dá pra conhecer o trabalho de um artista por um refrão?”
[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row][vc_column][vc_column_text]Tudo está à mão. Informação parcialmente infinita e não-linear no Facebook. Curiosidades bizarras a qualquer momento em sites. TV paga de graça via pirataria. Pornografia a quilos e em todos os estilos.
Quadrinhos, fotos, depoimentos – é só clicar. Bilhões de vídeos no YouTube? Pague com 5 segundos de paciência.
Toda a música do mundo de forma instantânea. Suas orelhas aguentam?
A oferta tentadora, com ares de maravilha e asas de libertação, nos envolve e nos determina culturalmente.
Sou da velha guarda. Conservo um respeito catedrático pela música. Não gosto nem de mudar de faixa – se você apertou o play, é para ouvir até o final. Dá pra conhecer o trabalho de um artista por um refrão?
O verbete “coleção”, já tão démodé, corre o risco de ser uma daquelas palavras com sentido incompreensível daqui a algumas décadas. É um luxo encontrar alguém que empreste ouvidos a um disco inteiro.
(Já percebeu o quão difícil é contornar a atenção alheia, cada vez mais seletiva?)
Se já parecia uma coisa entojada dispor de tanto espaço físico para acervo de qualquer espécie, hoje também pode significar bobagem estocar megabytes.
Pede-se desapego; vocábulo idílico e ingênuo, extenuado por webcards com formatações e conteúdo de cunho duvidoso.
Voltemos.
Toda a música do mundo de forma instantânea. O tempo aguenta?
Não vamos discutir sobre viabilidade comercial, mercado fonográfico ou novos modelos de negócio. Tudo isso sempre irá funcionar e um fato é implacável: onde houver música, haverá dinheiro – e muito bem equalizado em bolso fundo.
O assunto é mais sério.
A nostalgia do nosso presente está seriamente ameaçada. Como essa geração vai recobrar sua infância daqui há 20 anos em um ambiente musical no qual o que se sobressai aqui não se sobressai acolá?
Todos os carimbos, best-sellers e hits tão difusos. Na falta da uniformidade de difusão, sopram-se ídolos que chegam a proporções avassaladoras, mas deixam marcas mais confusas que sinais alienígenas em plantações de trigo.
A qualidade da nostalgia enfraquece. Ou amadurece em uma entropia de soma ainda incalculável.
O que fulano gosta, ciclano não conhece. No colossal mainstream, é mais fácil desconhecer do que conhecer. 5 milhões de views? Não faço ideia de quem seja – nem você. Todo mundo é famoso, mas nunca famoso o suficiente.
E no momento em que ninguém ousa esconder a própria produção, o underground, esse monstro viscoso que se alimenta de raridades, consegue sobreviver?
Fração. Assimetria. Telinha pequena. Play. Pause. Próxima. Stop.
(Stop e até nunca mais. Pra que segunda chance?)
Estamos livres, mas penhorando a memória. Ela não é nossa – é de quarteirões quilométricos de servidores espalhados em avenidas dentro de galpões reverberados.
O silêncio arrebenta.
Toda a música do mundo de forma instantânea. O futuro aguenta ou não se lembra?[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row][vc_row][vc_column][vc_column_text]
Autor: Eduardo Karas
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