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Sobre a Garagem

[vc_row][vc_column][vc_column_text]A R.Nott Magazine visitou a Garagem, um dos mais novos lugares dedicados a receber e expor o trabalho de artistas em Curitiba. Além disso, tratamos da sua exposição inaugural, Abstrações concretas, que nos serviu para pensar os caminhos de uma possível nova fotografia.[/vc_column_text][vc_column_text]

“Espaço de exposição, de residência, e idealmente de discussão e reflexão sobre o fazer artístico, a Garagem tem o objetivo de ocupar um espaço necessário – e bastante escasso em Curitiba – para o amadurecimento das relações entre artistas e artistas e também entre artistas e espectador.”

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          Curitiba acabou de ganhar um novo lugar ligado à arte. Mantida pela Airez – galeria de artistas independentes, A Garagem está localizada no bairro das Mercês e, há alguns dias apenas, abriu o seu portão e nos trouxe a sua exposição inaugural, Abstrações concretas. Espaço de exposição, de residência, e idealmente de discussão e reflexão sobre o fazer artístico, a Garagem tem o objetivo de ocupar um espaço necessário – e bastante escasso em Curitiba – para o amadurecimento das relações entre artistas e artistas e também entre artistas e espectador. A R.Nott Magazine esteve nessa inauguração, conheceu o espaço, conversou com o curador Scott MacLeay, tomou um chá e uma cachaça, e trata agora da impressão que ficou dessa iniciativa.

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          Pois bem. O recém-inaugurado espaço d’A Garagem se propõe a ser “um espaço multifuncional: galeria de arte, ateliê residência, instalação e palco para performances”. A iniciativa, que encontra agora poucos paralelos no cenário artístico curitibano, evoca programas de bastante tradição que atuam na mesma área, como, por exemplo, a Casa das Caldeiras e a Casa Tomada, ambos de São Paulo, além de diversos outros que aos poucos se espalham pelo país. Novas iniciativas e novos artistas se reunindo para terem ideias, discutirem, receberem o público e dialogarem a respeito dos resultados.

 

          Obviamente a iniciativa é importante. Mais do que isso, é uma dessas poucas tentativas de reunião de artistas que se prestam a algum objetivo outro, algo que se desvie do cotidiano do pensamento artístico da cidade, geralmente centrado entre escolas formais, circuito oficial de museus e galerias comerciais. A rotatividade de artistas de fora, por meio das residências, contribui para o raciocínio conjunto, o que resulta numa sempre enriquecedora conversa de intercambio de concepções. Além disso, o potencial do lugar se multiplica ainda mais quando ele se transforma em um espaço de encontro e discussão de ideias, de caminhos, vertentes e experimentação. Reuniões, encontros, críticas, bate-papo, conflito de opiniões, e um norte que, a partir daí, o artista trace solidamente para a sua produção. Argumentação. Convicção. Defesa do projeto. Diálogo e leitura. Em princípio, a Garagem se presta a esse tipo de ideal, e quanto mais lugares tivermos que funcionem para esse propósito, melhor. A exposição inaugural parece ser uma primeira semente disso. Esperamos realmente que seja verdade.

 

          E por que esperamos, exatamente?

 

          Iniciativas como essa já aconteceram na cidade, sendo frutíferas e reunindo nomes que se sagraram como importantes dentro do cenário artístico paranaense. Violeta Franco, por exemplo, aluna de Guido Viaro e uma das responsáveis pela difusão da arte modernista dentro do estado, tida como um correspondente curitibano da figura de Anita Malfatti, foi a fundadora da Garaginha (coincidência?), local de encontro de artistas que existiu entre 1949 e 1951 na garagem que ela herdou de sua família. Entre coquetéis, visitantes ilustres, artistas e gente que só estava ali pra ver o que passava, a Garaginha assumiu um forte traço de discussão da produção local e de ruptura com a arte de influência acadêmica representada por Alfredo Andersen, e resultou, poucos anos mais tarde, na formação do Clube de Gravura de Curitiba, organizado por Violeta Franco e Alcy Xavier no espaço subterrâneo da Escola de Música e Belas Artes do Paraná, ainda recém fundada.

 

          Podemos lembrar também do Grupo dos Onze, formado em 1988 e que contava com nomes como o de Osmar Chromiec, João Osório Brzezinzki e Domício Pedroso, entre outros. Pretendendo apresentar os seus trabalhos em novos espaços, essa reunião buscava abrir mais portas para a arte que se fazia em Curitiba. Por outro lado, em um caráter mais clássico de atelier de ensino e desenvolvimento, possuímos até hoje o valioso Atelier de Escultura chefiado por Elvo Benito Damo, que centraliza discussões e trabalho técnico, separado dos centros de ensino acadêmicos e das galerias. Um lugar, portanto, independente para funcionar através das próprias cabeças que movimentam o local. Reunião, discussão e prática; elementos que em todos os casos parecem consistir em pilares importantes de desenvolvimento artístico.

 

          Por isso reconhecemos a importância do local de discussão artística, e esperamos que espaços como essa nova Garagem floresçam, e surjam outros tantos, e que, no final das contas, entre um arranca rabo e outro – porque isso, senhores, é saudável –, haja crescimento e não tapinha nas costas; haja discussão e solidez e não aquele agrado tão melado que não serve pra ninguém, e que não leva a nada.

[/vc_column_text][vc_single_image image=”4721″ img_size=”full” alignment=”center”][/vc_column][/vc_row][vc_row][vc_column][vc_column_text]Agora, tratando um pouco a respeito da exposição de abertura da Garagem, Abstrações concretas.

 

          Que problemas enfrentamos quando tentamos abrir as porteiras da fotografia para um novo mundo ainda não explorado? Existe um novo caminho a se seguir? Esse é o problema com o qual os artistas se debateram a partir de um processo chamado Lens-based, ou seja, baseado, construído a partir de lentes fotográficas. Tendo esse ponto em comum e explorando caminhos bastante pessoais para alcançar uma resposta, podemos dizer que, enquanto espaço coletivo, a Garagem cumpre aí a sua primeira função, de girar em torno de um problema e tentar apresentar propostas para resolvê-lo.

 

          Durante uma conversa com o curador da exposição, o canadense Scott MacLeay, que reside atualmente em Florianópolis e é um tipo de padrinho dos diferentes artistas participantes da exposição, revelou-se a preocupação a respeito do processo de construção da imagem e do modo de pensamento de cada um deles sobre o objeto artístico. De certo modo, o que está exposto ali seria um reflexo dessa preocupação, do modo de pensar a fotografia, de justificar a escolha em se trabalhar com a fotografia e a partir dela, apontando, inevitavelmente, a um resultado estético.

 

          Este resultado, no entanto, não seria o ponto mais importante desse trabalho. O ponto mais importante é o processo, a pura reflexão de como se fazer ao invés de onde se chegar.

 

          É uma reflexão instigante.

 

          Mas, afinal, existem ali molduras na parede, contendo composições que vieram de algum lugar. Esse algum lugar é o processo. E o que vê o espectador? Deixo a pergunta para se pensar.

 

          Essa proposta apresentou resultados bastante diversos entre si, com trabalhos de pessoas de idades variadas, que passaram pelo abstracionismo geométrico, pela textura, pela manipulação digital. Sendo um objeto finalizado ou não, é um tipo de fotografia que se debate em expandir as fronteiras do pensamento fotográfico. Mesmo que se possa não concordar com ela, a discussão é sempre necessária e, neste caso, bastante razoável.

 

          No fim das contas, um dos grandes valores dessa exposição é a capacidade que ela tem de suscitar questionamentos bastante interessantes, principalmente por causa da preocupação que existe em se tentar apontar outros horizontes para uma nova fotografia. É difícil conseguir ter alguma noção de qual seria o caminho que esse meio deve percorrer no futuro. Afinal, podemos dizer que já se fotografou de tudo nesse nosso mundo? Estaríamos vivendo numa era de repetição de diálogos, fundados numa quase sagrada estilística da fotografia-de-rua, fotografia-documental, etc.? Com tanta gente tirando foto, quando é arte e quando não é?

 

          É difícil avaliar e muito menos prever o que vai acontecer nesse flash tecnológico desses nossos tempos. A lente, meus caros, é só mais um dos nossos inúmeros problemas.

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Vinicius F. Barth
Doutor em Estudos Literários pela UFPR. Tradutor das Argonáuticas de Apolônio de Rodes. Escritor e ilustrador. Autor do livro de contos 'Razões do agir de um bicho humano', (Confraria do Vento, 2015) e do livro de poemas e ilustrações '92 Receitas Para o Mesmo Molho Vinagrete' (Contravento Editorial, 2019). Ilustrador de Pripyat (Contravento Editorial, 2019). Estudante de saxofone.

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