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Descobertas concebidas

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“Penso que se pudéssemos materializar em sólidos os pensamentos eles seriam objetos resvalantes, isto é, no qual não se pode apoiar com firmeza, pois se alteram conforme o ângulo de observação e que são capazes de se aglutinar com seus pares formando novas formas ou cadeias de formas. Desta maneira minha arte está sempre querendo emular um pensamento.”

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          As formas, todas as formas, foram captadas pela minha câmera. As cores também, todas, estavam presentes lá no arquivo que o processador da minha câmera fez.

          Essas imagens são o que de mais próximo posso chamar de uma memória minha. Elas retratam uma caminhada pelo centro da cidade. Cada uma delas conta o que aconteceu. São a narrativa da passagem de um momento. Além do mais, nenhuma fotografia tradicional poderia ser mais fiel à minha lembrança, pois o que me lembro, lembro reconstruído, hora destacado, hora obliterado, sobreposto, misturado. Todos os elementos agora ganham novo significado capaz de existir através de minha observação, que é amálgama da existência em si, e por isso, uma imagem fotográfica só pode ser uma abordagem pessoal minha à passagem do momento.

          Isso me faz pensar nas novas descobertas da mecânica quântica: a luz pode ser onda ou partícula, conforme a relação com o observador. Ela se materializa frente nossa relação direta. Isso é uma metáfora para o processo de abordagem ao se lidar com a passagem do momento em artes visuais: não há um conteúdo a ser abordado, mas a abordagem ao conteúdo. Esta abordagem é o que cimenta, ou amálgama, o resultado imagético representativo de um momento inscrito no espaço-tempo. Essa imagem não pode simplesmente conter o assunto abordado, pois isso seria supor um assunto a priori, um universo inteiramente pré-concebido ao qual nos lançamos feito exploradores com o intuito de retornar com relatos desse desconhecido. Acontece que estamos mais para exploradores/construtores, uma vez que a interferência da observação é o que a faz a realidade sólida. Os relatos e inventários que trazemos não são apenas de achados e descobertos, mas de “achados-criados” e “descobertos-concebidos”. Posto que o ato de abordar o universo-assunto é um ato em si mesmo que deve ser levado em consideração como interferência co-criadora.

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          Minha busca é pelos movimentos que o pensamento faz enquanto co-criador desse universo-assunto no qual participamos ativamente. Tento puxar o fio dessa meada de uma maneira Lacaniana: tendo o pensamento como linguagem que contém léxico, forma e maneiras de funcionamento. Penso que se pudéssemos materializar em sólidos os pensamentos eles seriam objetos resvalantes, isto é, no qual não se pode apoiar com firmeza, pois se alteram conforme o ângulo de observação e que são capazes de se aglutinar com seus pares formando novas formas ou cadeias de formas. Desta maneira minha arte está sempre querendo emular um pensamento. 

          Nesse caminho, tenho estudado as obras do mestre Robert Rauschenberg como uma possibilidade de processo análogo anterior à minha pesquisa. Vejo suas obras como pensamentos materializados: sobrepostos, incertos e com inúmeras interpretações. Tentando entender um pouco do caminho que ele fez, agarro os pincéis, mas me descubro imediatamente e essencialmente um artista digital uma vez que meu processo é rápido, não no tempo cronológico, mas na medida em que posso mudar de ideia infinitamente sobre o que faço. Imagino que talvez Rauschenberg não tivesse a mesma celeridade inquieta que tenho, fruto da minha época. Essa é uma coisa que queria muito perguntar para ele. Cheguei até a imaginar uma carta que escreveria para Robert Rauschenberg perguntando isso. A carta começaria assim: “Prezado senhor, quanto tempo o senhor demora para preparar seu café da manhã…” e por aí vai.

          Enfim, estas imagens são a soma das cores e formas que vi e que em determinado momento lógico fizeram para mim um momento distinto que pode ser fracionado dentro do todo. Uma ida ao café não dura uma hora e dois minutos, mas dura o quanto eu sentir que estou fazendo aquilo. Já que uma vez que eu saia do café em que estou, posso ainda estar associando o momento de sair porta a fora e caminhar tranquilamente pela rua, ao “café que tomei ontem na rua”. 

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          Além do mais, quando me lembro do “café que tomei ontem na rua” minha memória afetiva tem sua imagética sem delimitação de tempo. Assim, lembro de tudo sem fracionamento, o café na mesa, minha caneta e caderno, as pessoas na rua, a decoração, e tudo se faz um bloco único que contém não só os assuntos que vi e vivenciei, mais o movimento do meu interesse passando de uma coisa à outra, de interesse à interesse, meneado pela minha mente, minhas idiossincrasias. Mas aqui algo de importante deve ser ressaltado: com importâncias iguais a todos elementos. Os aspecto cronológico acaba sendo obliterado pelo caráter emotivo das lembranças, estas últimas, que também retornam reinterpretadas e reconstruídas pela minha cognição.  Dessa maneira, o que faço vai se inscrevendo em uma imagem de múltiplos elementos. Isto é o resultado de uma busca para a seguinte questão: como falar da passagem do momento através de uma imagem estática. O resultado não é acurado, entretanto, apenas dá testemunho do verdadeiro sentimento-memória gerador da imagem. É um sussurro. Uma pista que guarda as principais características e formas, mas ainda é muito aquém da forma real. Como se quando eu pensasse em “árvore”, a minha imagem poderia ser no máximo um “Bonsai”. Guarda as semelhanças, mas não é capaz de expressar o seu todo maior.

          A questão atual é como o fator composicional altera (para o bem e para o mal) essa investigação. Uma questão angular é se o enquadramento e composição não interferem ou obliteram o que faço, o que no fundo daria ao trabalho um caráter quimérico, quase charlatão. Mas como pesquisador a possibilidade de cair no erro me anima muito: descobrirei uma maneira nova de “não” fazer o que faço e isto dará sentidos às pistas que coleto pelo caminho.

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