R.You

Sobre homens e insetos

Confira nesse mês o trabalho de Sidney Summers, autor soteropolitano, com um conto no nosso primeiro R.You literário!

“O homem é mais delicado
que o gafanhoto”


Charles Bukowski

 

Aos que acham que os homens são os mais cruéis dos animais indico que assistam o procedimento das formigas. Um cortejo em que levem, felizes, uma barata agonizante, recém pisoteada que ainda luta com suas patas para escapar. As patas restantes. As que ainda pode movimentar. Nós inventamos mecanismos de tortura mais sofisticados e sutis. Não deixamos, por exemplo, que aquele que assume o lugar da barata perceba que está sendo arrastado contra a sua vontade para ser devorado. Ou que será um cadáver guardado para um momento mais oportuno. Até conseguimos uma jornada sorridente quando nós mesmos incorporamos o papel da barata estrebuchante. Isso sim é civilização.

Quando vejo insetos me vêm à mente uma serie de analogias loucas, metáforas à vida humana… Pernilongos, evidentemente, são tão insistentes quanto testemunhas de Jeovah. Não há nada que os faça desistir. Eles se multiplicam, quando a gente se descuida e nem mesmo aplicações regulares de inseticidas são capazes de eliminá-los. Inseticidas… Eis o maior engenho humano após a invenção da roda.

Pernilongos se alimentam de sangue humano. Não que sejamos canibais. O exemplo dos tupinambás nos mostra sua inutilidade. Nenhuma herança. Nenhum herdeiro. Enquanto o sangue custa a vida, o suor vale ouro. Não, não proponho nenhum papo político. Os insetos usam a gravidade para foder no ar, sem charme. Eu entendo que um papo sobre comunismo (preciso citar o nome de algum partido?) hoje possa servir para comer alguém. Esse é o tipo de discurso que eu respeito! E acho que “esse cara” deve mesmo estar comendo alguém. O que é bem mais útil e interessante que a maioria dos textos que se pode ter contato. Já não consigo supor que alguém está nessa por inocência, apenas.

Mas o mundo é também dos inocentes. E dos que não leram a mensagem de George Orwell. Eu gosto do rola bosta que faz sua casa na merda. Simpatizaria mais se fosse sua própria merda. Somente a partir dela eu acredito na possibilidade de uma relação patriótica. O cavalo do cão voa barulhento e sem rumo certo. Uma lei seca na floresta e ele estaria extinto. As cigarras têm seu próprio canto e, felizmente, graças a ele, explodem. As asas da barata são mais úteis que as da galinha. Mas menos saborosas. Os besourinhos são cascudos e resistentes. As moscas vêm tudo com suas centenas de olhos, sem enxergar nada, de fato. No fim, tudo e todos tem uma utilidade. No fim, tudo e todos são inúteis.

 

Sobre o autor

Sidney Fortes Summers (1986 – ) é um escritor soteropolitano. Co-autor dos livros “Ratos com Asas” (Clubedeautores) e “Pão com Recheio de Sobras” (ainda inédito), autor de “Prazer, Sid!” (AgBooks), “Como os Velhos Cães” (Coisa Edições) e “Os Dias Quentes se Arrastam Mornos” (coletânea a ser publicada também pela Coisa Edições). Tem textos publicados em diversas revistas nacionais (Ellenismos, Cruviana, Jornal Relevo, Desenredos, Cinzas no Café, Verbo 21, dentre outras) e internacionais (Moçambique, Argentina, Portugal, Suiça e México). Como roteirista trabalhou nos curtas “Olho Mágico”, “Aroma Café com Cinzas” e na web-série de quatro capítulos “Mata Alta”. É co-editor da revista Evoé, membro do conselho editorial da revista Cruviana (6° edição) e estudante do bacharelado interdisciplinar em artes da UFBA.

 

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