Ruído

A transa entre som e visão

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capa: The Buggles – Video killed the radio star (1979)

O primeiro clipe musical a ser exibido pela MTV em sua estreia, nos Estados Unidos em 1º. de agosto de 1981.

[/vc_column_text][vc_column_text]Juliano Samways, nosso guru de headphones, inaugura a coluna Ruído de 2017 falando sobre as relações entre o fenômeno musical e a imagem. Por que estamos tão acostumados a “ver” a música?[/vc_column_text][vc_column_text]

“Os novos artistas devem tentar desfazer esse dogma imagem-som-movimento, refundar o espiritual, desvelar o som do visual para que o ouvinte crie suas próprias imagens, defina suas dimensões, calcule suas proporções, some a base, multiplique pela altura, divida pelo infinito…”

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         Como cantou David Robert Jones (1947-2016), AKA David Bowie: “don’t you wonder sometimes, about sound and vision”. Pensamos e pensamos muito acerca da relação entre som e visão, ou mais especificamente, na relação entre música e sua forma visual, ou ainda: hiper-pensamos sobre se é possível nos dias de hoje se desvincular a música da imagem. Bowie foi um mestre em elaborar novas linguagens nessa relação entre a música e a imagem do cantor, se reinventou visualmente várias vezes, foi o grande camaleão do rock, dinamizou uma relação já intensa entre o sonoro e o visual, o som e a visão.

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A transa entre som e visão não nasceu ontem. A relação da música com a imagem nos remete, por exemplo, ao início da Ópera Moderna, com a prática da encenação dramática da peça musical. Lá já se pensava a relação entre música e sua representação visual: como tal trecho deveria ser transportado em imagens; como dado personagem se conectava com a música. Grandes espetáculos foram montados. A obra wagneriana, por exemplo, é de uma genialidade quase que inigualável. Desde os grandes números de ópera, passando pelos séculos XX e XXI da nossa era, esta interdependência entre aquilo que se escuta com aquilo que se vê se tornou quase que um ser “em si – para si”. A máquina da arte começou a girar cada vez mais na relação entre estes dois mecanismos da percepção.

 

O big bang pop da MTV nos anos 80 e 90, e depois com a massificação das redes sociais, com seus vídeos palpitando anywere anyhow, consolidou esta síntese entre som e visão preconizada por Wagner, vestida de forma elegante por Bowie, embalada para presente pela MTV, tornada onipresente pela internet. Se escutava música pela televisão e agora nos deleitamos pela tela do smartphone.

 

Estaria o espírito da música condicionado a uma união indissociável com os estímulos nervosos nas metáforas dos pixels?

 

Não é querer pressupor uma total negação da beleza que esse composto de áudio e vídeo podem nos causar. Trabalhos de extrema beleza são feitos ano após ano. Poderíamos citar vários, mas para não tagarelar por demais, indicamos a obra musical-documentário-visual Sonic Highways (2014) lançado pela banda Foo Fighters, realizada também para atender as demandas da tv a cabo e streaming. É um belo composto audiovisual.

 

O breve questionamento que aqui colocamos é exatamente se de agora em diante podemos pensar a música de forma desvinculada do seu composto visual. Uma música somente sonora, para se escutar e não se ver. Os novos artistas devem tentar desfazer esse dogma imagem-som-movimento, refundar o espiritual, desvelar o som do visual para que o ouvinte crie suas próprias imagens, defina suas dimensões, calcule suas proporções, some a base, multiplique pela altura, divida pelo infinito…

 

O que observamos na atual condição da música é que a imagem acaba por ser um pacote de venda para um produto que consumimos melhor quando melhor embalado.

 

Nietzsche, que já fora mui fã da opera de Wagner e metáforas, diz em seu texto Sobre Verdades e Mentiras no Sentido Extra-Moral: “Um estímulo nervoso é primeiramente transposto em uma imagem! Primeira metáfora. A imagem é transformada em um som! Segunda metáfora”. De metáforas em metáforas seguimos significando o mundo.

 

A arte dos últimos tempos tem primado pela experimentação, junção, ampliação na fusão de várias linguagens. Talvez seja a hora de mono-trilhar o múltiplo, focar o espírito novamente no um, para num futuro ainda mais longínquo se lançar novamente no dois, talvez…

 

Imaginar a música ao invés de vê-la. Escutemos o que o velho Bowie tem para nos dizer, mas de olhos bem fechados. Don’t you wonder sometimes, about sound and vision?

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Juliano Samways
Professor de filosofia, autor, músico, estudante, ex-enxadrista, ex-filatélico.

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